Sonhos lúcidos

Por definição, o sonho é um complexo conjunto de imagens, sons e sensações que acontecem quando estamos dormindo e, na maioria das vezes, sem consciência de que tudo isso está acontecendo. Viu esse “na maioria das vezes”? É porque algumas pessoas, em alguns casos, não apenas sabem que estão sonhando como têm controle sobre a narrativa do sonho. São os chamados sonhos lúcidos.

Sim, eles são reais. 

O que são os sonhos lúcidos

Sonhos lúcidos são os sonhos nos quais a pessoa está ciente do fato de estar sonhando e tem o poder de decisão entre controlar o sonho e efetivamente fazê-lo ou assistir passivamente o desenrolar da história. 

Eles sempre foram objeto de muito mistério e curiosidade popular, o que apenas aumentou com representações na cultura pop. É o caso do premiado A Origem (Inception), no qual Dom (Leonardo DiCaprio) é um ladrão cuja especialidade é extrair informações do inconsciente dos seus alvos enquanto eles estão sonhando. 

Estima-se que 55% dos adultos já tiveram pelo menos uma experiência com sonhos lúcidos enquanto 23% os têm com frequência (ao menos uma vez por mês). 

Ao afetar mais da metade da população adulta, é de esperar que as pessoas tenham relatos bastante diferentes sobre como é ter o poder de controlar o próprio sonho. Enquanto para alguns a experiência é realista e vívida, para outros ela é bastante nebulosa. Algumas pessoas ainda relatam que os sonhos lúcidos são diferentes a cada vez que acontecem.

Diversas pesquisas tentaram associar essa consciência atípica durante o sonho com algum nível específico de qualidade do sono, mas nenhuma delas foi capaz até agora de determinar essa conexão. Isso quer dizer que os sonhos lúcidos não estão ligados nem à alta e nem à baixa qualidade do sono. 

Como os sonhos lúcidos funcionam

Um sonho “normal” pode acontecer em qualquer fase do sono, apesar de estar mais associado ao sono REM, já que é quando eles costumam ser mais vívidos e intensos. Não é à toa que durante essa parte da noite o corpo sofre uma espécie de paralisia, chamada atonia, que impede que uma pessoa reaja fisicamente ao conteúdo do sonho.

Já os sonhos lúcidos, esses sim acontecem majoritariamente durante o sono REM e são produtos de sonhos “normais”. Este é um consenso entre os cientistas e especialistas de sono.  

Mas não são muitos os consensos científicos em termos de sonhos lúcidos. Muito sobre eles ainda permanece um mistério para a ciência. Uma das teorias sobre sua origem aponta para um estado de semi-vigília e para uma alta de atividades no córtex pré-frontal.

O córtex pré-frontal tem como função mais conhecida o processo neurológico de funções executivas, tais como tomada de decisão, controle inibitório e atenção. Prejuízos a ele conduzem a episódios de impulsividade, agressividade e falta de adequação social.

Benefícios dos sonhos lúcidos para a saúde

A ciência ainda estuda possíveis benefícios dos sonhos lúcidos para as pessoas. Um deles é no tratamento de pesadelos e distúrbios do pesadelo.

“Essa abordagem é denominada terapia comportamental da imagem reversa, uma vez que o paciente é treinado a desenvolver a capacidade de transformar seu pesadelo em um sonho lúcido e, dessa forma, modificar o enredo do seu pesadelo. Porém, não é uma tarefa fácil, exige muito treino e perseverança”, explica o Dr. Luciano Ribeiro, neurologista, em entrevista à Revista do Sono.

Outros possíveis benefícios dos sonhos lúcidos que já foram ou estão sendo estudados estão:

• Melhoras no desempenho físico e motor por meio de “ensaios” durante o sono’’
• Solução criativa de problemas;
• Oportunidades de pesquisa da relação entre corpo e mente e consciência.

De momento, os efeitos reportados nessas pesquisas são fracos e inconsistentes. Mais estudos ainda são necessários.

Perigos

E então quais seriam os perigos dos sonhos lúcidos? Bem, assim com os benefícios eles ainda estão passíveis de discussão, mas são essencialmente dois.

O primeiro deles envolve a saúde mental. Para alguns estudiosos, forçar a aparição de sonhos lúcidos (falaremos mais disso a seguir), pode deixar a linha divisória entre sonho e realidade mais difusa, o que poderia ter consequências negativas de longo prazo para a saúde mental de algumas pessoas. 

Outro dos potenciais perigos está na disrupção do sono. Como os sonhos lúcidos estão associados a mais atividade cerebral do que sonhos não lúcidos, acredita-se que eles tenham como consequência uma noite de baixa qualidade.  

Ambas as situações ainda requerem mais investigação.

Indução de sonhos lúcidos

Como é impossível prever como será o sonho de uma pessoa, foram desenvolvidas algumas técnicas que podem ajudar na indução dos sonhos lúcidos, permitindo assim que eles possam ser estudados.

Algumas dessas técnicas consistem em práticas pouco recomendadas de disrupção do sono. Outras, porém, são menos “agressivas”. Conheça:

• Indução mnemônica de sonhos lúcidos, conhecida como MILD (do inglês mnemonic induction of lucid dreams). Consiste em “se treinar” para aprender a diferenciar entre sonho e realidade. A pessoa é acordada após cinco horas de sono e repete para si mesma a frase “a próxima vez que eu dormir, vou me lembrar que estou sonhando” ou alguma variável. 

• Wake back to bed, ou WBTB. Consiste em acordar de quatro a cinco horas depois de dormir e se levantar da cama por um período que pode ir de 15 a 90 minutos (varia de pessoa para pessoa), mantendo-se alerta, mas sem fazer com que voltar a dormir seja impossível (como se exercitar ou tomar café). Depois, retorna-se para a cama relaxado, mas focado em ter um sonho lúcido. Geralmente, é associada à MILD.

• Teste de realidade, que consiste em ir se perguntando ao longo do dia, diversas vezes, se você está sonhando ou dormindo para se “educar” a diferenciar o que é real daquilo que não é. 

Existem ainda à venda aparelhos que prometem ajudar as pessoas a terem mais sonhos lúcidos por meio de estimulação física e luminosa. Tenha cuidado ao usá-los.

Boa noite.