“Contrate o caráter, treine as habilidades”. Provavelmente, você já deve ter ouvido esse conselho de muitos especialistas em Recursos Humanos.

O problema, no entanto, sempre esteve em como descobrir o real caráter do candidato antes da contratação.

Afinal, o ambiente corporativo está repleto de tentações, que testam as pessoas todo santo dia: desde reivindicar crédito pela ideia ou trabalho feito por outro colega, mentir sem medir consequências para fechar uma negociação, até relatar números financeiros falsos para evitar problemas para o seu lado ou aceitar suborno para “facilitar” um determinado negócio.

Pesquisas recentes indicam que a capacidade de autocontrole é um dos fatores determinantes para uma pessoa resistir a essas tentações e se manter ética no ambiente do trabalho.

Fisiologicamente falando, o autocontrole é um processo comportamental que se dá em grande parte na região do córtex pré-frontal do cérebro e usa a glicose como combustível. Ou seja: enquanto houver um bom volume de glicose nessa região do cérebro, a pessoa consegue se manter controlada, resistindo às tentações, enquanto consome esse nutriente. Mas se esse “combustível” se esgota, suas “defesas morais” se fragilizam e ela tende a ceder às tentações de se comportar de maneira antiética.

Por outro lado, outras pesquisas recentes mostraram também que enquanto o sono restaura a glicose no córtex pré-frontal, sua privação pode drenar esse precioso nutriente do autocontrole.

Segundo matéria publicada da prestigiada Harvard Business Review, quatro estudos em contextos laboratoriais e de campo, demonstraram que a falta de sono pode levar a altos níveis de comportamento antiético, a partir da diminuição do chamado autocontrole.

E, segundo os estudos, não é preciso que a privação de sono seja muito intensa para que se comece a perceber os desvios de comportamento. Em um dos estudos de laboratório, houve uma diferença de apenas 22 minutos de sono entre aqueles que trapacearam e os que não trapacearam. Também nos estudos de campo, uma variação de 2 horas de sono por noite foi suficiente para que se identificasse um comportamento antiético no trabalho no dia seguinte.

A assustadora conclusão é a de que a crescente crise de sono no mundo pode acabar acarretando uma crise ética também.

Afinal, é sabido que as pessoas que exercem os cargos mais importantes ou influentes nas organizações são, frequentemente, as mais privadas de sono. Segundo estatísticas norte-americanas, enquanto 30% da população adulta em geral dormem menos de seis horas por noite, esse número sobe para mais de 40% quando a amostra é composta apenas por pessoal de cargos gerenciais.

Segundo Christopher M. Barnes, professor associado de administração na Foster School of Business da Universidade de Washington, “as organizações precisam ter mais respeito pelo sono. Executivos e gerentes devem ter em mente que, quanto mais pressionam os funcionários para trabalharem tarde, chegarem mais cedo ao escritório e responderem e-mails e chamadas a qualquer hora, mais estão abrindo as portas da empresa para comportamentos antiéticos”.

Por isso, da próxima vez que seu chefe lhe perguntar “o que você faz da meia-noite às seis”, responda sem medo de errar: estou reabastecendo meu autocontrole para me manter produtivo e ético no meu trabalho.